Oscar Krost
Em tempos líquidos em vias de evaporação, em que disseminada a visão de que tudo pode ser resolvido pelo uso de aplicativos ou de tutoriais, a oportunidade de ler “Do pré-contrato de trabalho: o contrato preliminar de trabalho no iter da contratação laboral: abordagem comparativa e jusfundamental”, do renomado jurista Guilherme Guimarães Feliciano, revigora a crença do Direito do Trabalho como legítimo marco civilizatorio e da produção crítica como fator essencial à reflexão.
Edição publicada em 2010, pela editora LTr, fruto de Tese de Livre-docência apresentada à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), devidamente aprovada, impressiona pela atualidade. Por questão de justiça, o termo adequado a defini-la é atemporal, predicado das grandes obras, jurídicas ou não.
Diante das carências legislativa e doutrinária sobre o pré-contrato no Brasil, o autor se ampara no Direito Comparado e em estudos estrangeiros, munindo-se de elementos necessários ao desenvolvimento da abordarem pretendida. Visita com mestria a normatividade de países como Alemanha, França, Itália, Suíça, Espanha e Portugal, apegando-se ao regramento deste último por nele identificar 4 elementos que o aproximam da realidade nacional, a saber: compatibilidade normativo-ideológica, proximidade cultural e linguística, utilidade sociojurídica e filiação histórica.
Se alguma dúvida ainda persistir a respeito da relevância do estudo do negócio preliminar na seara trabalhista, especificamente, Feliciano a dirime, ao esclarecer:
“A autonomia privada não se exerce tão livremente quanto nos contratos civis clássicos (…) porque há direitos expectativos que decorrem de lei imperativa e não podem ser derrogadas (em ato ou potência), como também há posições mais favoráveis positivadas em instrumentos de regulamentação coletiva ou administrativa (…) que não podem ser voluntariamente dispensadas (irremunciabilidade).“1
A obra com méritos, ainda, vai até as fontes e os fundamentos do Direito do Trabalho, dando especial atenção aos Princípios, propondo uma “abordagem jusfundamental”, expressão cunhada por Robert Alexy,2 para definir o contexto de observância às liberdades fundamentais, a exemplo das liberdades de ação profissional, de trabalho, de resistência, de livre iniciativa e de propriedade. Consegue tornar compreensível tema de elevada complexidade em apenas 200 páginas.
Que o anseio de Guilherme Guimarães Feliciano, quanto à importância de construirmos não “um Direito do Trabalho complessivo e de minúcias (…), mas um Direito do Trabalho basal, de princípios e regras – que, num futuro próximo, venha a se converter em teoria genuinamente ‘geral“,3 possa se concretizar em ações, a iniciar pela leitura de seu texto, importante passo em direção a este devir.
1 FELICIANO, Guilherme Guimarães. Do pré-contrato de trabalho: o contrato preliminar de trabalho no iter da contratação laboral: abordagem comparativa e jusfundamental. São Paulo: LTr, 2009, p. 173.
2Ob. cit. p. 24.
3 FELICIANO, Guilherme Guimarães. Do pré-contrato de trabalho: o contrato preliminar de trabalho no iter da contratação laboral: abordagem comparativa e jusfundamental. São Paulo: LTr, 2009, p. 73.
Ainda não li essa nova contribuição acadêmica do Guilherme mas já estou a salivar, meu caro Oscar. Ótima resenha!
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