Oscar Krost
Os fatos ocorridos no último domingo (08 de janeiro) pararam o país. Tudo o que ocupava as pautas televisivas, midiáticas e sociais acabou posto de lado.
O Direito do Trabalho não ficou de fora e perguntas começaram a ser feitas sobre os efeitos do ocorrido nas relações de emprego.
Patriotismo, vandalismo, terrorismo…o termo adotado importa menos do que o precedente a ser criado a partir da decisão do empregador sobre a continuidade ou não do contrato, bem como a forma com que a trabalhadora ou o trabalhador punida/punido reagirá.
A participação na manifestação que depredou prédios públicos na capital federal, pura e simples, enseja a configuração de justa causa? Em caso de resposta positiva, em qual das alíneas do art. 482 da CLT seria a capitulação?
Depende.
Estar em um espaço público de forma pacífica, exercendo a liberdade de expressão, pura e simples, não traz qualquer repercussão na esfera trabalhista. Em um regime democrático a regra é a liberdade de pensar e agir.
Contudo, se a presença envolver direta ou indiretamente o fomento, instigação ou a prática de atos violentos, inclusive preparatórios, e isto vier a público, pode caracterizar quebra do dever de boa-fé e atentar contra a boa fama do empregador. Na hipótese de pactuação de cláusula contratual especifica, envolvendo direito de imagem ou condutas não admitidas a questão ganha contornos ainda mais definidos.
Caberia aplicar o art. 482, parágrafo único, da CLT para fundamentar a dispensa por justa causa?
Novamente depende.
Há três correntes sobre o tema.
A primeira entende não recepcionado pela Constituição de 1988 o dispositivo; a segunda o considera revogado pela Lei n. 8.630/93, art. 76; a terceira reputa vigente e aplicável.
Majoritariamente, portanto, entende-se que a regra em questão não seria fundamento à dispensa por justa causa. Há fundamento em sentido diverso, porém minoritário.
A prova da participação efetiva e do grau de envolvimento caberá sempre ao empregador, e sua correta tipificação,.diante do Princípios da Proteção e da Legalidade, além da Presunção de Inocência e da Continuidade da Relação de Emprego.
Agir com imediatidade e proporcionalidade também é essencial para que, de um dia para o outro, alguem que não apenas tolerou como estimulou posturas de índole questionável e hoje repudiadas se torne guardião da Constituição e do Estado Democrático de Direito. Muito cuidado no julgamento moral, antes mesmo de adentrar na esfera jurídica.
E a dispensa sem justa causa de quem organizou ou participou das manifestações é regular ou pode ser entendida como discriminatória?
Depende.
Mais uma vez devemos atentar aos detalhes dos elementos do caso concreto e das circunstâncias que os antecederam. Não apenas de parte de quem trabalha, como de quem emprega.
Geralmente, a experiência demonstra que a corda arrebenta do lado mais fraco, hipossuficiente e vulnerável. Não é sempre, mas uma forte tendência.
Feliz ou infelizmente, não há respostas prontas, acabadas e definitivas para as dúvidas postas e porvir. Cautela e ponderação são essenciais, principalmente no calor da emoção, quer para evitar caça às bruxas e revanchismos, quer para não banalizarmos as garantias e conquistas constitucionais sociais.
Além disso, assim como ocorreu nos recentes debates sobre a vacinação compulsória e a relação de emprego, o que hoje for decidido sobre os limites do Poder Diretivo, para o bem e para o mal, servirá como precedente sobre “hard cases” futuros, gerando repercussões completamente desconhecidas em 11 de janeiro de 2023.
Ao debate e à busca dos porquês!